- Foram três dias de assombro...
Falava...as palavras espalhavam-se como água e havia bocas que se abriam de espanto, e olhos paralisados colados na sua voz.
- O vento rugia com tal força, que os alicerces das casas descolavam da terra como dentes podres, e os homens trabalhavam amarrados a estacas de ferro de dez polegadas, e os tímpanos rebentavam e tudo quanto era ser vivente ensurdecia....
As mães ajoelhavam aos pés das camas onde as suas crianças dormiam. Ajoelhavam e velavam o sono inquieto, atemorizadas por alguma rajada insolente que entrasse por baixo da porta e lhes levasse os inocentes.
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-Eu vi! Ninguém me contou! Eu vi bem, três crianças pequenas, todas de mãos dadas, que se ergueram no ar como balões e voaram pelos céus , até desaparecerem por detrás de uma nuvem cheia de vento...não mais voltaram...eu bem vi...
......
- Depois foi a chuva, começou de madrugada e alagou tudo o que estava seco, só sobreviveram os que sabiam nadar....ou voar...
Começou de madrugada. Quando o vento de calou. Começou com tiros de canhão, que ecoavam nas casas como se estas estivessem vazias de coisas e de almas.
Fui à janela. Eram ovos do tamanho de punhos de homens grandes. Ovos de gelo que caiam com estrondo, e quando caiam saiam deles uns pintos encharcados que se derretiam e deixavam no ar um cheiro a gemada com aguardente.
E aqueles pintos derretidos, alagaram tudo o que estava seco...depois abriram-se bicas lá no céu, e fontes derramaram toda a água sobre nós. Safou-se quem nadava.....ou voava....
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-No último dia trovejou. E não houve noite, só dia claro, e um qualquer cegava com os clarões dos relâmpagos. E as árvores do campo tornaram carvão, queimadas da raiz às folhas, e a paisagem ficou pintada em tons de preto e branco... cinzento....e luz.
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-Por fim o silêncio...os que ficaram, apanharam os cacos, varreram as casas, escoaram as ruas, fizeram leitos de rio todos de novo, arrumaram as vidas....
Foram três dias de assombro. Eu vi......
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Depois calou-se, saiu para a rua, cortou a corda que o prendia à porta, com uma navalha de bolso, e tirou os pés do chão, devagar....deixou no ar um cheiro forte a gemada quente com aguardente.
Imagem by Weee (Amazing)