Olha para mim. Só um bocadinho...
Não me toques como se eu fosse água...sempre com medo que te arraste para fora de pé.
Não me olhes como se eu fosse vento...sempre com medo que eu derrube muros em ti.
E não me ames com medo que me desvaneça...como se eu fosse esperança.
Não sou água, ou vento, ou esperança.
Nada em mim é rebelião, ou lugares distantes.
Antes sou pântano , calmaria, resignação.
Por isso nada temas. Não te vou magoar. Nem poderia!
Até porque são tantas as vezes, em que tu e eu somos um.
Siameses de braços caídos. Corpos ausentes de um hoje que se faz tarde.
Agora a sério! Não tenhas medo. Já não sonho.
Hoje de manhã, estavam a cortar as ervas na beira da estrada. Uma ceifa que deixou o ar carregado de cheiros de campos saturados de águas e temperos. Uma aroma tão verde, que por momentos me acordou a fadiga.
Depois passou. Ficou lá atrás, na berma da estrada, e eu segui o dia que nascia fora do meu reduto.
Sim, eu também tenho muros! Ergui-os aos poucos, com suor salgado e às vezes doce. Com a força dos meus braços, das minhas mãos, com o sopro da minha indiferença.
Ao meio dia, quando o sol já vai alto, passei outra vez. As ervas cortadas, jaziam numa exaustão colhida à força, e o cheiro agora era tão intenso como o teu silêncio.
Havia anis e licor de poejo e ervas doces, na respiração ofegante das ervas tombadas.
O calor fermentou-as, e o ar estava exuberante de bebedeiras e faces coradas.
Um aroma tão quente, que quase me queimou a fadiga.
Depois passou. Ficou lá, a brincar com incautos errantes, que cansados de tudo e de nada por ali se perdiam.
Mas eu não.
Não tenhas medo.
Eu já não sonho.