O homem olhou-a, sério, compenetrado, seguro, como se estivesse à beira de anunciar a cura para a tristeza.
- O que sei da vida? É isso que te interessa? É só isso que te interessa!?
...sei que baste... e tu....?
já abriste o vidro do carro, quando a velocidade te acossa, e a chuva te aperta num cerco que quase te sufoca?
Porventura podes descrever o peso das gotas grossas a cair impiedosamente sobre as plantas mais frágeis, até elas esmagadas gritarem em desepero por um sopro seco?
Nesses dias em que a humidade é uma epidemia, e as árvores entornam na terra cheiros e rios de seiva....sentiste-te bêbeda desse excesso de odores?
Nesses mesmos dias, conseguiste soltar no vazio que trazes, as gargalhadas de crianças a pular descalças nas poças de água?
Fizeste estalar a lingua de prazer a morder raizes molhadas da brandura das manhãs de Inverno?
.....não....
....sei que não.....
Então o homem, compadecido pela ausência de calor naquele ser, tomou-lhe o rosto com as suas mãos, roçou-lhe a boca num beijo volátil e saiu porta fora sem olhar para trás.
Image by Deviantart